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Felipe Cerquize e Roberto Menescal |
Na penúltima vez que encontrei com Roberto Menescal, ele falou muito comigo sobre a amizade que tinha com Nara Leão e o sufoco que foi a tentativa de prolongar a vida dela, depois que ficou doente. Ele teve participação ativa nessa sobrevida da Nara. Ontem, encontrei com o mestre de novo e ele me falou uma porção de coisas sobre a Elis. Contou-me detalhes da produção daquele disco antológico de 1972, que tem "Casa no campo", Atrás da porta", "20 anos blues" etc. Todas as músicas do trabalho foram selecionadas pelo Menescal, que acertou nas moscas de um alvo que ele criou só com moscas. Só estando presente na conversa e participando da riqueza de detalhes, que Roberto Menescal gosta de contar, para entender o que eu digo. Vou descrever rapidamente duas passagens:
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1.Quando procurou Francis Hime para oferecer uma música para esse disco chamado "Elis", de 1972, ele mostrou várias, mas Menescal ficou fascinado em uma canção que era parceria com Chico Buarque, mas que ainda não tinha sido concluída a letra e, por falta de inspiração, a parceria acabou ficando de lado por uns três ou quatro anos. Então, Menescal pegou a canção inacabada, fez uma gravação em estúdio e procurou Chico Buarque para mostrar. Com a introdução, Chico não se deu conta, mas quando começou a letra, ele falou "Peraí! Essa é uma parceria que tenho com Francis, mas que ainda não terminei" "Pois é, Chico" - Disse Menescal - "Estou querendo colocar essa sua parceria no novo disco da Elis". Chico Buarque, então, pegou o que tnha da letra e em cinco minutos, escreveu a segunda parte: "Dei pra maldizer o nosso lar / Pra sujar teu nome, te humilhar / E me vingar a qualquer preço / Te adorando pelo avesso / Até mostrar que inda sou tua...". Completava-se, assim, "Atrás da porta", uma das mais belas parcerias de Francis Hime e Chico Buarque, que se eternizou na voz de Elis.
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2.Depois de ter masterizado o disco acima citado, cuja seleção das canções foi toda de Menescal, ele foi até a casa de Elis para mostrar o resultado. Ronaldo Bôscoli, então marido dela, queria participar da audição, mas Menescal proibiu."Só a cantora, dona do disco, tem o direito de ouvir o resultado neste momento", disse. Foi com ela para um quarto da casa que tinha muitas tralhas e um toca-discos, trancou a porta, pôs o LP na agulha e deixou tocar. Elis Regina escutou o disco do início ao fim sem falar absolutamente nada. Ao final, ela abriu um sorriso e falou (com essas palavras): "P*rra, eu sou f*da para escolher repertório!". Foi aí que Menescal concluiu que efetivamente tinha feito um ótimo trabalho, capaz de sensibilizar a intérprete a ponto dela admitir ter escolhido as músicas, mesmo não tendo.
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É isto, meus amigos. Quanto mais encontro com Roberto Menescal, mas compreendo como ele conseguiu tantos bons resultados ao longo de sua vida profissional. Um cara efetivamente fora de série.
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